Eu cheguei primeiro… do aprendiz ao jovem mestre

Por Waldyr de Souza



Eu fui o primeiro...

Tenho uns parentes que são metodistas. Tinha uma prima, que ela sempre quis falar comigo daqui da Associação... da escola. Mas... ela tinha medo da minha reação. Um dia, ela conversou com um dos professores... o professor Cristóvão, de aulas manuais e, ele foi lá em casa. Ele conversou comigo, me mostrou umas coisas em Braille, trabalhos manuais e... eu vim para cá para estudar [, em 1959, com 19 anos].

O primeiro livro que a gente começou a estudar era o Robson Crusoé. Eu lembro... o Sr. José Ferreira Martins dava aula... ele dava aula de tudo: era geografia, história, ciências. Ele ensinava tudo! Inclusive a leitura e a escrita, né? Porque o método Braille é meio complicado; principalmente para escrever com reglete. Na máquina não. Na máquina é mais simples, mas com a reglete... a gente escreve igual a japonês: de trás para frente. Eu aprendi o Braille, o alfabeto, aprendi tudo! Como eu já tinha estudado, foi mais fácil; foi só aprender o alfabeto, depois montar as palavras...

Me alfabetizei e estudei um pouco no Metodista. Eu fiz o ginásio, fiz o quarto ano do colegial o que seria hoje o Ensino Médio e depois fiz dois anos de Magistério... Nessa época, tive bastante apoio do Sr. José Ferreira Martins. Quando eles davam o nome de um livro lá no Metodista, ele já procurava se comunicar em São Paulo para ver se tinham esse livro... no Rio de Janeiro, no Benjamin Constant, também... Então, quer dizer que tive todo o apoio para poder estudar. Mas, mesmo assim, eu parei. Não terminei o curso [de Magistério], porque achei que não ia valer a pena.... porque naquela época a gente não tinha as oportunidades que tem hoje; não tinha possibilidade nenhuma de um cego dar aula ou fazer qualquer coisa. Então, eu pensei: “Eu vou ter apenas um diploma pendurado na parede, nada mais do que isso”. Então... eu parti para o trabalho.

O Sr. José Ferreira Martins com os afazeres dele, e sendo que eu já estava alfabetizado, pediu se eu poderia dar aula para os alunos. Eu falei: - “Mas Sr. José, eu não sei se posso”. Ele disse que eu tinha capacidade e que poderia ensinar. E, eu peguei esse cargo de professor, sem ser professor. E, acho que fui bem! Me dei bem... na época, acho que tinha uns 10 alunos... Eu pegava no pé mesmo... comigo não tinha brincadeira: - “Vamos estudar, vamos estudar”. Eu ensinei a Mara a escrever a primeira cartinha para o Papai Noel... Eu fui o primeiro professor da Carmen... Aí eu fiquei... eu fiquei... eu fiquei dando aula para os meninos e trabalhando... Em 1969 eu saí..

“Se ele tivesse feito uma faculdade em pedagogia ou magistério, o Waldyr poderia estar dando aula para nós até hoje, mesmo que ele fosse aposentado... Ele era muito bom para ensinar! Muito bom mesmo!” – Mara.

2020 - Waldyr de Souza - ex-aluno e ex-professor da Escola para Cegos "Helen Keller"